
Por hoje, bastava-me uma garrafa de vinho para me embriagar. Espírito dionísico para beber um sonho. Mas o cálice da realidade impede-me de conquistar a eternidade do céu de uma boca ou de qualquer paraíso feito de suspiros e palavras. A razão não compreende a emoção. Embates e embustes. A paixão vale pelo silêncio que engloba. Vale por tudo que não conseguimos dizer, por tudo que não conseguimos perguntar, porque muitas vezes as perguntas não são possíveis.
Debruço-me sobre o parapeito de uma janela que não me pertence. Nada me pertence. Poucas pessoas no mundo são tão despidas quanto eu. Tenho uma nudez que fere. Uma nudez que quer ser dividida. É sublime doar um pedaço de si. Uma mutilação que constrói sonhos. Quantos sonhos seriam necessários para desvendar o mistério de um homem? Talvez nenhum. Podem-se desintegrar os átomos de um homem com atitudes. Com algum impulso de sangue latino podem-se brindar belas descobertas. Mas amor é outra coisa. Amor é o nome que eu persigo e pelo qual me perdi algumas vezes. Fui infeliz em todas as felicidades. A lua rasteja o futuro por caminhos inexplorados. Quero estar suficientemente viva para trafegar com meus sonhos por esses desígnios. Já não estarei confinada num canto do mundo com essa sobrecarga de imagens..
Queria pensar sem formas, mas já não posso...
O medo de decepcionar, o medo de não ter medo... Toda a palavra tem seu preço. Sou vítima de um sistema colectivo de encadeamento de idéias. Até o amor tem as suas terminologias. Até o amor tem as suas ciências..
Mas hoje estou incurável..
Queria um amor..sem pressa e sem causa. É porque é, porque tem de ser. Um amor sem história ao acaso, como se nunca tivesse sido sonhado ..
De verdade, quando se vive milhares de noites, já não se pode precisar em que noite antiga, muito antiga, se plantou o sonho..
Poderia dizer que hoje estou pronta para o desafio, mas o amor tem viés que desconheço. Mal posso falar da anatomia. Tanta beleza em uma só. Tanto pecado num mesmo pecado. Resgate, remissão... Eros, Ágape, Fileu... gravitar em torno do outro... melhor mergulhar numa taça de vinho e lamber a emoção altruística (ou seria egoística? de ter sido capaz de escrever estas linhas..
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